Como uma cidade alemã quer se tornar a capital das bikes até 2020

Por Alessandra Petraglia e Heloisa Aun

Por: Redação

“A capital das bicicletas“. É assim que Bonn, no estado da Renânia do Norte-Vestfália, na Alemanha, quer ser conhecida em 2020. O plano um tanto quanto ambicioso foi idealizado em 2012, quando as prefeituras da cidade e dos municípios vizinhos estipularam uma série de medidas para estimular as pessoas a pedalarem diariamente. A ideia é que, em poucos anos, o número de bikes supere o de carros.

As medidas, que envolvem melhorias na infraestrutura, gestão urbana e educação, podem ser vistas em uma curta caminhada por Bonn. Semáforos sinalizados com a imagem de uma bicicleta, faixas exclusivas para ciclistas, entre outras ações, possibilitam uma maior inclusão deste meio de transporte.

Em uma das principais pontes da cidade alemã, a Kennedybrücke, foi instalado recentemente um “barometer” – como os contadores de bikes em São Paulo –, que já aponta o número de cerca de 1,3 milhão de bicicletas que passaram pelo local apenas em 2017.

As bicicletas podem ser encontradas por todos os cantos em Bonn
As bicicletas podem ser encontradas por todos os cantos em Bonn

A importância do projeto é percebida pelos moradores de Bonn e das cidades vizinhas. “Andar de bicicleta é muito importante para mim porque tudo que eu faço é pedalando. Na cidade ou quando vou para fora dela é bem rápido, pois não fico no trânsito. E, além disso, estou sempre pegando um ar fresco”, relata a alemã Vane Wurth.

“Eu recomendo que as outras cidades construam ou criem infraestrutura para as bicicletas, como lugares nas ruas onde só as bikes andem e onde os motoristas dos carros possam vê-las. Acho que você tem que se sentir seguro em uma bicicleta para que possa andar cada vez mais”, completa a ciclista.

A cidade de apenas 300 mil habitantes tem mais de 3 mil km de vias para bicicletas
A cidade de apenas 300 mil habitantes tem mais de 3 mil km de vias para bicicletas

Até o início de 2017, a cidade de apenas 300 mil habitantes já tinha mais de 3 mil km de vias adequadas aos ciclistas, entre rotas de bicicletas, ciclofaixas, ciclovias e calçadas compartilhadas. E os planos são ainda maiores: a ideia é expandir essa área em mais 25% – ou seja, mais 750 km de vias próprias para os ciclistas.

Segundo a prefeitura de Bonn, a estratégia para a construção de uma “capital das bicicletas” inclui, entre outras medidas: a otimização das ciclovias existentes; melhorias de segurança; expansão do ciclismo como um sistema de rede; análise de possíveis circuitos prioritários nos semáforos; ligação do ciclismo com o transporte público, ampliando as vagas na estação central e melhorando a estrutura para a população levar as bicicletas nos ônibus e trens; expansão do estacionamento nas ruas; construção de um sistema nacional de aluguel de bikes; mostrar a públicos-alvo as vantagens do ciclismo.

Durante a COP 23, bicicletas são disponibilizadas como uma alternativa para o deslocamento entre os centros de discussões e exposições do evento. Uma forma sustentável e eficiente para que os participantes utilizem com mais frequência esse meio de transporte. Além disso, a frase “Eu estou pedalando por…”, completada por palavras como “salvar o planeta”, “um planeta saudável”, “menores emissões” e “uma mobilidade mais verde”, foi adicionada às bikes para destacar a importância que elas têm para a cidade.

Enquanto isso, em São Paulo

Embora não seja possível comparar Bonn com São Paulo por causa de suas realidades distintas, a cidade alemã, além de outras ao redor do mundo, pode servir como um exemplo para possíveis avanços em termos de mobilidade na capital paulista.

Segundo o Mapa da Infraestrutura Cicloviária, São Paulo tem 498,3 km de vias com tratamento cicloviário permanente, sendo 468 km de ciclovias/ciclofaixas e 30,3 km de ciclorrotas.

O investimento para tornar a cidade mais receptiva aos ciclistas ocorreu nos últimos anos, principalmente na gestão de Fernando Haddad, com a implementação das vias adequadas às bikes e tentativa de fazer com que essa rede cicloviária fosse conectada entre si, mas ainda há muito a ser feito.

“Com as primeiras ciclovias, e as ciclofaixas de lazer aos fins de semana, as pessoas começaram a criar essa cultura da bicicleta. A malha cicloviária é um grande avanço, mas também há outros pontos complementares, como a política de bikes compartilhadas, os bicicletários da CPTM e do Metrô”, destaca Flavio Soares, do Ciclocidade.

Ciclovia da Avenida Paulista
Créditos: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Ciclovia da Avenida Paulista

Segundo o especialista, esse contexto de avanços vem dentro de uma estrutura jurídica. “Haddad fez muitas coisas que não são visíveis para a população, como a aprovação do Plano Municipal de Mobilidade Urbana (PlanMob), em 2015, e do Plano Diretor. Esse plano segue o Plano Nacional de Mobilidade Urbana (PNMU), que enfatiza que as prioridades são os pedestres, os ciclistas e depois os meios coletivos de transporte”, afirma.

No entanto, em 2017, a Prefeitura de João Doria começou mal em relação à mobilidade, tratando de forma equivocada os espaços de participação da população, como no caso do aumento da velocidade das marginais.

“Na figura do Secretário de Transportes, Sérgio Avelleda, a gestão é dúbia, pois, ao mesmo tempo que sinaliza que as bikes são uma prioridade, tem atrasos muito concretos na prática, como problemas de fiscalização, manutenção e conectividade, aumento do número de mortes de ciclistas e pedestres, além de não cumprir o planejamento de expansão dessas vias”, diz Flavio.

Mas o que pode ser feito para tornar a cidade mais receptiva às bikes? Para Davi Martins, especialista do Greenpeace em Mobilidade Urbana, uma possibilidade seria continuar a implementação de ciclofaixas, ciclovias e ciclorrotas, aumentar a rede existente de ciclovias, reparar partes dessa rede e ter uma sinalização melhor para o ciclista, garantindo mais segurança.

“É preciso haver uma comunicação da Prefeitura, sinalizando a bicicleta como um meio de transporte e pedindo respeito aos motoristas e motociclistas em relação ao ciclista e ao pedestre”, explica.

“O principal incentivo que vemos em outros países sobre o uso da bicicleta é em relação a tornar uma cidade como São Paulo, que hoje é dominada por automóveis, mais humana, levando as pessoas à rua, as tornando visíveis, tanto pedestres como ciclistas, e mostrando que a gestão quer que essas pessoas caminhem e pedalem”, declara Martins. Por consequência disso, ocorreria uma diminuição de CO2 dos automóveis e uma diminuição de material particulado dos ônibus.

Como ressalta o especialista do Ciclocidade: “A bicicleta é simples e, por isso, ela demanda que as mudanças sejam simples e rápidas, mas sempre analisadas”.

  • A cobertura da COP 23 é uma parceria entre o Climate Journalism e o Instituto Clima e Sociedade (iCS) para incentivar a produção de jovens jornalistas sobre temas relacionados às mudanças climáticas e a mobilidade urbana. 
  • As jornalistas viajaram a convite das organizações.