Março Azul alerta para câncer de intestino, um dos mais comuns no Brasil

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), são esperados cerca de 45 mil novos casos desse tipo de câncer por ano no país

Por Silvia Melo em parceria com João Gabriel Braga (Médico - CRMGO 28223)
18/03/2025 20:29

Março é internacionalmente reconhecido como o mês de conscientização sobre o câncer de intestino, uma iniciativa conhecida como “Março Azul“, organizada este ano pela Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (Sobed) e pela Sociedade Brasileira de Coloproctologia (SBCP).

Essa campanha tem como objetivo alertar a população sobre a importância da prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado desse tipo de câncer, que é um dos mais incidentes no Brasil e no mundo.

Este ano, a redução da idade recomendada para o início do rastreamento, de 50 para 45 anos, é um dos destaques da campanha, que reflete o aumento da incidência da doença em pacientes mais jovens.

Câncer de intestino no Brasil e no mundo

De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o câncer de intestino, frequentemente chamado de câncer colorretal, é o terceiro tipo de câncer mais comum no Brasil, excluindo-se os casos de câncer de pele não melanoma.

As estimativas para o triênio 2023-2025 indicam cerca de 45 mil novos casos por ano no país. Globalmente, dados da Agência Internacional para Pesquisa em Câncer (IARC) apontam que o câncer colorretal é o quarto mais comum, com mais de um milhão de casos novos diagnosticados anualmente.

A doença é silenciosa e requer atenção aos seus sinais e fatores de risco. Cerca de 65% dos casos de câncer de intestino são diagnosticados em estágios avançados, o que dificulta a recuperação dos pacientes, além de exigir procedimentos mais agressivos, como quimioterapia, radioterapia e cirurgias mais complexas e invasivas.

O diagnóstico precoce, considerado um aliado também diante da ausência de sintomas na fase inicial da doença, aumenta em até 90% a chance de cura.

O que é o câncer de intestino ou colorretal?

O câncer de intestino é um termo mais amplo, que pode englobar tanto o câncer colorretal quanto tumores em outras partes do trato gastrointestinal, como o intestino delgado. 

O câncer colorretal refere-se aos tumores que se iniciam no intestino grosso (cólon) e no reto (parte final do intestino, imediatamente antes do ânus).

Geralmente, esse tipo de câncer se desenvolve a partir de pólipos adenomatosos, que são lesões benignas na mucosa intestinal que podem se transformar em malignas ao longo do tempo.

A detecção e a remoção desses pólipos por meio de exames de rastreamento, como a colonoscopia, são fundamentais para a prevenção da doença.​

Câncer colorretal pode evoluir a partir de pólipos
Câncer colorretal pode evoluir a partir de pólipos - madigraphics/istock

Fatores de risco: o que você precisa saber

1. Idade avançada

O risco de desenvolver câncer colorretal aumenta com a idade, sendo mais comum em pessoas acima dos 50 anos. No entanto, a incidência vem crescendo entre os mais jovens, reforçando a importância do rastreamento precoce.

2. Histórico familiar e genética

Pessoas com parentes de primeiro grau diagnosticados com câncer colorretal apresentam um risco maior. Além disso, síndromes genéticas hereditárias, como a polipose adenomatosa familiar (PAF) e a síndrome de Lynch, elevam significativamente as chances da doença.

3. Alimentação pouco saudável

Uma dieta rica em carnes vermelhas e processadas, gorduras saturadas e pobre em fibras aumenta o risco da doença. O consumo de frutas, verduras, legumes e grãos integrais contribui para a saúde intestinal e reduz a probabilidade de desenvolvimento de tumores no cólon e reto.

4. Sedentarismo e obesidade

A falta de atividade física regular e o excesso de peso estão associados ao aumento do risco de câncer colorretal. O exercício físico ajuda a regular hormônios e a melhorar o funcionamento intestinal, reduzindo a inflamação crônica.

5. Tabagismo e consumo excessivo de álcool

O cigarro contém substâncias cancerígenas que podem contribuir para o desenvolvimento de tumores no cólon e reto. O consumo excessivo de álcool também está relacionado ao aumento do risco da doença.

O que explica o aumento de casos entre os jovens?

Nos últimos anos, tem sido observado um aumento preocupante nos casos de câncer colorretal entre os jovens. Esse fenômeno levanta questões importantes sobre os fatores que contribuem para essa tendência. O estilo de vida moderno é a teoria que mais ganha força entre os médicos e cientistas.

Segundo o Dr. Samuel Aguiar, líder do Centro de Referência de Tumores Colorretais do A.C.Camargo Cancer Center, a doença tem maior incidência em áreas urbanas e entre adultos economicamente ativos, de 40 a 69 anos.

“Tornou-se comum ver pacientes cada vez mais jovens, com idades entre 35 e 40 anos, sendo diagnosticados com câncer colorretal. Esse aumento está diretamente ligado a hábitos alimentares inadequados e fatores relacionados ao estilo de vida”, afirma.

Estilo de vida moderno é apontado como um dos responsáveis pelo aumento de casos de câncer de intestino entre jovens
Estilo de vida moderno é apontado como um dos responsáveis pelo aumento de casos de câncer de intestino entre jovens - eternalcreative/istock

Nos dias de hoje, muitos jovens adotam hábitos de vida menos saudáveis, incluindo dietas ricas em alimentos processados, pobre em fibras e com alto teor de gordura saturada.

Além disso, o sedentarismo tem se tornado mais comum, contribuindo para o aumento da obesidade e outros problemas de saúde, que por consequência estão ligados ao câncer colorretal.

A epidemia de obesidade entre adolescentes e adultos, condições como a síndrome metabólica (obesidade, hipertensão, diabetes e colesterol elevado, entre outros), o sedentarismo prolongado, características cada vez mais frequentes. Esse combo certamente influencia no risco. 

Muitos estudos alertam para o consumo excessivo de carne vermelha e processada, que pode estar associado ao aumento de casos de câncer colorretal em jovens.

Uma pesquisa da Cleveland Clinic, publicada na revista científica NPJ Precision Oncology, revelou que pacientes jovens com câncer colorretal apresentam níveis mais elevados de metabólitos relacionados a esses alimentos em comparação com pacientes acima de 60 anos.

Esses metabólitos, derivados da dieta, sugerem que a ingestão excessiva de carne vermelha e processada pode aumentar o risco de desenvolvimento precoce da doença.

Outro estudo, publicado na revista Gut, apontou o consumo excessivo de bebidas açucaradas como um dos principais vilões do câncer de intestino. Evidências mostram que tomar duas ou mais bebidas açucaradas por dia duplica as chances de câncer de intestino em adultos antes dos 50 anos. 

Entre as maiores vilãs da saúde intestinal estão bebidas esportivas e energéticas, bebidas com sabor de frutas e refrigerantes, consideradas as maiores fontes de açúcares adicionados na dieta ocidental.

Sintomas do câncer de intestino

O câncer de intestino pode se desenvolver de forma silenciosa nos estágios iniciais. Os sintomas podem passar despercebidos ou serem confundidos com problemas digestivos comuns. No estágio inicial, o tumor pode se desenvolver sem causar dor ou desconforto evidente.

Algumas das primeiras manifestações incluem mudanças discretas no hábito intestinal, como períodos alternados de diarreia e prisão de ventre, sensação de evacuação incompleta e fezes mais finas do que o normal. Além disso, pode ocorrer fadiga persistente e perda de peso sem explicação aparente, reflexo das alterações metabólicas causadas pelo crescimento do tumor.

Com a progressão da doença, os sintomas se tornam mais evidentes e preocupantes. O sangue nas fezes, que pode variar de sangue vermelho vivo a um tom mais escuro, é um dos sinais mais comuns. O paciente também pode sentir dores ou cólicas abdominais frequentes, além de inchaço e excesso de gases. Esses sintomas podem indicar que o tumor está crescendo e dificultando a passagem das fezes pelo intestino.

A anemia também pode surgir devido à perda de sangue gradual, causando fraqueza e palidez. Diante de qualquer um desses sinais persistentes, é fundamental procurar um médico para um diagnóstico precoce e preciso.

A que mudanças se atentar?

  • Alterações no hábito intestinal – Episódios frequentes de diarreia ou prisão de ventre sem motivo aparente podem indicar problemas no cólon ou reto.
  • Sangue nas fezes – A presença de sangue vermelho vivo ou escurecido pode ser um sinal de tumor no intestino.
  • Dor ou desconforto abdominal – Cólicas, gases excessivos ou sensação de inchaço persistente podem estar relacionados ao crescimento do tumor.
  • Fezes finas ou em fita – Modificações no formato das fezes podem indicar obstrução parcial do intestino.
  • Sensação de evacuação incompleta – A impressão de que o intestino não foi completamente esvaziado após evacuar pode ser um sinal de alerta.
  • Perda de peso inexplicada – Emagrecimento repentino sem mudança na dieta ou rotina pode ser um sintoma de câncer.
  • Fadiga e fraqueza – A anemia causada por sangramentos internos pode levar à sensação constante de cansaço.

Como prevenir o câncer de intestino?

A prevenção do câncer de intestino começa com a adoção de hábitos saudáveis, principalmente em relação à alimentação.

Uma dieta rica em fibras, composta por frutas, verduras, legumes, cereais integrais e leguminosas, auxilia no bom funcionamento do intestino e reduz o risco de inflamações que podem levar ao desenvolvimento do câncer colorretal.

É essencial reduzir o consumo de carnes processadas, como embutidos e defumados, e moderar a ingestão de carnes vermelhas, pois estudos apontam que esses alimentos estão associados a um maior risco da doença. Beber bastante água e evitar o consumo excessivo de álcool também são medidas fundamentais para a saúde intestinal.

A prática regular de atividades físicas é outro fator importante na prevenção do câncer de intestino. O sedentarismo está relacionado a um maior risco de obesidade e resistência à insulina, condições que podem favorecer o surgimento de tumores colorretais.

Exercícios aeróbicos, como caminhada, corrida e ciclismo, aliados a treinos de força, ajudam a manter um metabolismo equilibrado e um sistema digestivo saudável.

Além disso, é importante evitar o tabagismo, pois o cigarro contém substâncias cancerígenas que afetam diversas partes do corpo, incluindo o trato digestivo.

Por fim, o rastreamento precoce é uma das medidas mais eficazes para a prevenção do câncer de intestino. De acordo com o doutor Hélio Antônio Silva, presidente da Sociedade Mineira de Coloproctologia e médico coloproctologista do Hospital Orizonti, a colonoscopia é a principal ferramenta de prevenção.

“A colonoscopia é um procedimento importante, pois, permite a detecção e remoção de pólipos adenomatosos, lesões pré-malignas que podem evoluir para câncer. Como os pólipos são assintomáticos, a indicação é que o exame deve ser realizado a partir dos 45 anos. O resultado da colonoscopia é, geralmente, informado no mesmo dia, embora em alguns casos, quando há necessidade de biópsia, o laudo possa levar até 10 dias”, explica o especialista.

Como é feito o exame de colonoscopia? 

O médico realiza a colonoscopia com o paciente sedado, usando um instrumento flexível chamado colonoscópio, com um câmera na ponta. Ele o insere através do ânus do paciente em direção ao cólon.

A microcâmera na ponta do aparelho envia a imagem de vídeo para um monitor, permitindo que o médico examine todo o interior do cólon, em busca de anormalidades, como pólipos, úlceras, inflamação ou sinais de câncer colorretal. Se o médico encontrar quaisquer irregularidades, ele pode realizar biópsias ou remover pólipos durante o procedimento.

Colonoscopia é recomendada a partir dos 45 anos para a população em geral e, para quem tem histórico familiar da doença, pode ser indicada ainda antes
Colonoscopia é recomendada a partir dos 45 anos para a população em geral e, para quem tem histórico familiar da doença, pode ser indicada ainda antes - ~UserGI15994093/istock

A colonoscopia é um exame que geralmente não causa dor, especialmente porque há a sedação do paciente antes do procedimento. No geral, a maioria dos pacientes não relata dor ou qualquer desconforto. 

Tratamento do câncer de intestino

O tratamento do câncer de intestino varia conforme o estágio da doença e a condição do paciente, sendo a cirurgia a principal abordagem nos casos iniciais. A remoção do tumor pode ser feita por colonoscopia, em casos de pólipos pequenos, ou por cirurgia convencional, quando há comprometimento mais extenso do intestino.

Em estágios mais avançados, pode ser necessário retirar parte do cólon ou do reto, podendo ser feita uma colostomia temporária ou permanente, dependendo da localização e da gravidade do tumor. A cirurgia, muitas vezes, é combinada com outros tratamentos para aumentar a eficácia.

Além da cirurgia, a quimioterapia e a radioterapia são frequentemente utilizadas, especialmente nos casos mais agressivos ou quando o câncer já se espalhou para outras regiões do corpo. A quimioterapia utiliza medicamentos para destruir as células cancerígenas ou impedir sua multiplicação, podendo ser administrada antes ou depois da cirurgia.

Já a radioterapia, mais comum no câncer de reto, usa radiação para reduzir ou eliminar o tumor, sendo muitas vezes combinada com quimioterapia para potencializar os resultados. Além disso, terapias-alvo e imunoterapia têm sido estudadas e utilizadas em alguns casos específicos, oferecendo novas possibilidades de tratamento para determinados perfis de pacientes.

Tratamento via SUS

No Brasil, o tratamento do câncer de intestino é oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS), garantindo acesso a exames de diagnóstico, cirurgia, quimioterapia e radioterapia gratuitamente.

No entanto, o tempo de espera pode variar de acordo com a demanda e a região, o que torna essencial a detecção precoce da doença para aumentar as chances de sucesso no tratamento.

Pacientes diagnosticados devem buscar atendimento em unidades de referência em oncologia para dar início ao tratamento o mais rápido possível, seguindo as diretrizes médicas e os protocolos estabelecidos para cada caso.