Por que os shows de Gusttavo Lima estão na mira das autoridades?

Cachê exorbitante em cidade com pouca infraestrutura e contrato milionário de show que foi cancelado estão entre as polêmicas que envolvem dinheiro público

Os shows de Gusttavo Lima tomaram a atenção nos últimos dias devido a problemas relacionados a possíveis irregularidades no pagamento de cachês exorbitantes com o dinheiro público, principalmente vindo de cidades pequenas nos interiores do Brasil.

Com um show sendo investigado pelo Ministério Público de Roraima e outro cancelado pela Prefeitura de Conceição do Mato Dentro (MG), o que está acontecendo na carreira do artista e de onde surgiram esses questionamentos sobre o uso de recurso dos cofres públicos para shows?

Por que os shows de Gusttavo Lima estão na mira das autoridades?
Créditos: Reprodução/Instagram @gusttavolima
Por que os shows de Gusttavo Lima estão na mira das autoridades?

Quando tudo começou?

Essa história de cachês sendo pagos com dinheiro público ficou em evidência logo depois das invertidas de Zé Neto, da dupla com Cristiano, à Anitta, durante um de seus shows, que aconteceu dia 12 de maio deste ano.

“Nós somos artistas e não dependemos de Lei Rouanet, nosso cachê quem paga é o povo. A gente não precisa fazer tatuagem no ‘toba’ para mostrar se a gente está bem ou não. A gente simplesmente vem aqui e canta e o Brasil inteiro canta com a gente”, disse Zé Neto na ocasião.

Na apresentação de Sorriso (MT), o cantor também criticou a Lei Rouanet, uma bandeira levantada e defendida por Jair Bolsonaro (PL), que foi o candidato escolhido pela dupla sertaneja para fazer campanha eleitoral em 2018.

No entanto, o show daquela noite, que aconteceu em 12 de maio, foi pago com dinheiro público advindos do cofre da Prefeitura de Sorriso, no Mato Grosso.

Dinheiro público gasto com shows

Depois da polêmica instaurada, não demorou muito para a imprensa expor que Zé Neto e Cristiano faturaram pelo menos R$ 3 milhões com shows pagos por prefeituras pelo país. No show em Sorriso (MT), em que criticou uma lei que ajuda artistas e o incentivo à cultura, eles receberam R$ 400 mil. Foi descoberto que eles ganharam R$ 250 mil de Itabaiana (SE), R$ 253 mil de Colina (SP) e R$ 320 mil de Uruana (GO).

Quando o problema caiu no colo de Gusttavo Lima?

Artistas de todos os gêneros musicais já foram ou estão sendo contratados e pagos com dinheiro público, porém a grande problemática desse esquema é a conta final não bater.

Para existir um equilíbrio econômico, a cidade contratante precisa ter o mínimo de devolutiva financeira e prefeitura responsável pelo evento precisa fazer os cálculos para pagar um valor justo ao artista que se apresenta.

E foi justamente esse ponto que pegou principalmente para Gusttavo Lima. Foi exposto que ele fez um contrato com a Prefeitura de São Luiz, em Roraima, para receber R$ 800 mil em apenas um show, na 24ª edição da vaquejada na cidade, que está prevista para acontecer em 1º, 2º e 3 de dezembro deste ano.

Show de Roraima passa por investigação do Ministério Público

A pequena cidade de São Luiz, em Roraima, tem um pouco mais de 8 mil habitantes, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Sendo assim, dividindo o cachê do show do sertanejo entre os moradores locais, incluindo crianças e adultos, cada um pagaria R$ 100 por pessoa. Além disso, a cidade tem um PIB de R$ 147,6 milhões, o segundo menor do estado, ficando atrás só de Uiramutã.

Com despesas fundamentais sendo ignoradas pelo município como infraestrutura, saúde e educação, a contratação do artista chamou a atenção do Ministério Público de Roraima (MP-RR), que passou a investigar o processo contratual do órgão público com o cantor.

O cachê pago pela prefeitura a Gusttavo Lima é 433,3% maior que o pago à dupla sertaneja Cesar Menotti e Fabiano. Já a única mulher entre as atrações, Solange Almeida, receberá o valor 640,7% menor do que o do sertanejo.

Estrada de São Luiz, em Roraima, a cidade que fez contrato de R$ 800 mil para um show de Gusttavo Lima
Créditos: Arquivo Pessoal/Elizabete da Silva
Estrada de São Luiz, em Roraima, a cidade que fez contrato de R$ 800 mil para um show de Gusttavo Lima

Outro show cancelado e investigação do Ministério Público de Minas Gerais

Na última sexta-feira, 27 de  maio, o Ministério Público de Minas Gerais (MP-MG) instaurou um procedimento para fazer identificar a existência de elementos com o objetivo de investigar as despesas do evento.

Porém, no último sábado, 28, a Prefeitura de Conceição do Mato Dentro informou o cancelamento do show de Gusttavo Lima, que teria o cachê de 1,2 milhão e de César Menotti e Fabiano, que receberiam R$ 520 mil.

Ainda estarão no evento, que acontece entre os dias 17 e 23 de junho, Israel e Rodolffo com o cachê de R$ 310 mil, Di Paulo e Paulino por R$ 120 mil, João Carreiro por R$ 100 mil e Thiago e Jonathan por R$ 90 mil.

Segundo a prefeitura de Conceição do Mato de Dentro, existe uma tentativa de envolver o evento “em uma guerra política e partidária que não tem nenhuma ligação com o município e nem tampouco com a tradicional festa”.

Contrato dá direito aos artistas ficarem com metade do valor, mas Prefeitura nega pagamento

De acordo com o contrato firmado entre a Prefeitura de Conceição do Mato Dentro e a “Balada Eventos e Produções LTDA”, empresa de Gusttavo Lima, no valor de R$ 1,2 milhão, metade do montante seria pago no ato da assinatura, que aconteceu em abril, e a outra metade deveria ser quitada até 15 de junho de 2022.

O contrato do show prevê multa de 50% do valor do negócio em caso de rescisão. Por isso, há uma compensação, e o artista não precisaria devolver o valor que, neste caso, já estaria pago. Sendo assim, mesmo com o show cancelado, ele receberia R$ 600 mil.

No entanto, a Prefeitura de Conceição do Mato Dentro nega quaisquer pagamento prévio e segundo o executivo “o contrato administrativo, ao contrário das relações civis, exige procedimentos prévios ao pagamento, que não foram supridos” – não foram detalhados quais eram os procedimentos.

Conforme a própria interpretação do município, não haverá aplicação de multa pois previsão contratual prevê pagamento de multa só para notas fiscais que foram emitidas, o que não ocorreu pelos procedimentos prévios necessários não terem sido efetivados.

Comunicado da Prefeitura de Conceição do Mato Dentro na íntegra

1 – A cavalgada é considerada a segunda maior do país, reunindo mais de 10.000 cavaleiros e amazonas na última edição. Faz parte das comemorações do Jubileu do Senhor Bom Jesus do Matosinhos, tradicional festa religiosa de Minas Gerais, que completa 235 anos, sendo uma das maiores romarias do Brasil, muito aguardada nesse ano pós pandemia.

2 – A população de Conceição do Mato Dentro recepciona os fiéis com uma grande festa, das quais já participaram Zezé de Camargo e Luciano, César Menotti e Fabiano, Maiara e Maraísa e outros grandes artistas.

3 – Ao contrário do que vem sendo divulgado, não houve nenhum pagamento aos artistas Gusttavo Lima e Bruno e Marrone. Da mesma forma, não haverá incidência de multa pelos cancelamentos, já que a previsão contratual exige motivos injustificados, o que não acontece no caso.

4 – Com perplexidade, nos deparamos com notícias que dizem que os shows ocorriam com verbas da saúde e educação. Referidas assertivas levianas e tendenciosas, demonstram absoluto desconhecimento sobre as formas de utilização dos recursos advindos da Mineração, reguladas pela Lei Federal nº 13.540, que autoriza gastos com fomento econômico, bem-estar social, turismo, diversificação econômica, saúde, educação e outros.

5 – Inclusive, Conceição do Mato Dentro foi um dos poucos municípios do país que atingiu todos os índices estabelecidos para Saúde e Educação, no último ano.

6 – Os gastos com os recursos advindos da mineração são aplicados de forma responsável e dentro da lei. Inclusive, criamos o Fundo Municipal de Diversificação Econômica, em 2017, referência para os municípios mineradores, não só do País.

7- Estamos determinados em restabelecer a verdade, construir a paz e trabalhar pelo desenvolvimento econômico e social do nosso Município.